domingo, 6 de janeiro de 2013

Intelectual ensina o uso do apito

 Salvio Spínola Fagundes Filho - Foto: Apito do Bicudo
Quando a CA/CBF pediu ao  árbitro Salvio Spínola Fagundes Filho, que  devolvesse o escudo da Fifa no crepúsculo de 2011 e de que seu nome seria inserido na categoria especial da (Renaf) Relação Nacional de Árbitros de Futebol, a partir de 2012, Spínola sequer elucubrou a respeito da proposta que recebeu. Respondeu não e encerrou de forma magnífica sua carreira como árbitro de futebol.
Para tomar a decisão de encerrar definitivamente sua brilhante trajetória na arbitragem, Spínola, levou em consideração  os  oitocentos e setenta e dois jogos que dirigiu ao longo da sua trajetória magnífica como árbitro, as vinte finais de campeonatos que apitou, os inúmeros Torneios Sul-Americanos, a participação na direção de jogos das Eliminatórias da Copa do Mundo, na Alemanha, África do Sul, Coréia do Sul e a participação na Copa América de 2011. Foi este arcabouço que  propiciou o estofo necessário para o excelente árbitro, Salvio Spínola Fagundes Filho, absorver sem traumas a proposição que lhe foi feita pela CBF.
Como o árbitro de futebol no Brasil  é  utilizado como objeto descartável, Salvio Spínola, moço de ótima família, educado, visionário, formado em Ciências Contábeis com especialização em finanças,  além de laborar na arbitragem,  aproveitou o hiato que o apito lhe proporcionava formando-se também  em  Direito, onde atualmente advoga na área tributária.
Com a arbitragem vertendo nas suas veias, foi difícil ficar longe do meio do qual vivenciou por mais de uma década e logo foi convidado pelo prócer da arbitragem Sul-Americana, Dr. Carlos Alarcón, para atuar como delegado da Conmebol.
E assim que o Instrutor da Fifa Aristeu Leonardo Tavares, assumiu o comando da CA/CBF, foi convocado para ser o instrutor dos árbitros brasileiros pré-selecionados para a Copa do Mundo de 2014.
Na conversa que travou com este colunista via fone e posteriormente via e-mail , Spínola fala do final da sua carreira, do convite para ser instrutor dos nossos homens de preto, o estágio em que eles estão e diferentes temas inerentes à arbitragem. Confira abaixo.    

Por que o sr. teve antecipada a sua saída do quadro da Fifa?
Esta pergunta deve ser feita à CBF. Eu simplesmente fui informado e é assim que funciona. Me informaram que por não ter mais ciclo de Copa do Mundo, idade, eu deixaria a FIFA  para outra vaga e continuaria apitando como Árbitro Especial.  Não aceitei esta condição por entender que estava em alto nível técnico e físico. Inclusive soltei uma nota à imprensa sobre este tema.

Após ter laborado na função em diferentes pontos do planeta, como surgiu e como  recebeu o convite para ser o preparador do trio de árbitros que vai representar o Brasil na Copa de 2014?
Com muita satisfação fui convidado pelo sr. Aristeu Tavares para exercer esta função. Que fique claro que a nós, eu e o Ednilson Corona, não foi solicitado treinamento, porque esta função é dos instrutores da FIFA. A nós, foi pedido pelo presidente da CA/CBF, Tavares,  uma preparação para os Seminários da FIFA. Como passamos pelo processo de seleção de Copa de Mundo, Aristeu quer que os árbitros brasileiros cheguem mais preparados nestes seminários.

Qual é a sua função e do seu congênere Ednilson Corona na preparação dos nossos apitos?
Mostrar aos árbitros o que a FIFA exige. O que está no processo de seleção da FIFA para os árbitros. Com isso, optamos por massificar todas as atividades que a FIFA aplica, ou seja, repetimos dezenas de vezes as mesmas provas elaboradas pela entidade  internacional: regras em inglês, lances em vídeo a serem respondidos em inglês, entrevistas em inglês e lances no campo de jogo simulado por jogadores.

Em que estágio estão os nossos homens de preto no que tange ao Mundial?
No primeiro seminário saíram-se muito bem nas provas teóricas. Na prova física os dois assistentes foram bem e o árbitro não foi aprovado. A FIFA deve definir novo trio agora em janeiro.

Quais são os treinamentos que estão sendo ministrados aos árbitros que estão inseridos neste processo e qual será a trajetória até a data da Copa?
Pela FIFA o treinamento consiste em participação de seminários e torneios Sub-20, Sub-17, Copa das Confederações, Mundial de Clubes. São 54 trios onde a FIFA deve ficar com 30 ou 34, ainda vai definir. Pela CONMEBOL são 10, onde devem ficar 6 ou 7. Todo dia os árbitros são obrigados a acessarem uma plataforma de internet respondendo questões e analisando vídeos. A trajetória é um processo de seleção, onde tudo é considerado, tendo o teste físico como obrigatório. Os árbitros devem fazer aproximadamente 3 a 4 testes físicos em 2013.

O Brasil dada a posição da Fifa não terá árbitros e assistentes na Copa das Confederações. Mas quando abril de 2014 chegar e a entidade internacional anunciar os nomes dos trios que irão atuar no Mundial, o futebol brasileiro terá um trio de alto nível na Copa?
Sim, o Brasil terá um trio de alto nível em 2014.

No recém findado Mundial de Clubes no Japão, observamos que a dinâmica da arbitragem aplicada difere muito do estilo do árbitro brasileiro na marcação de infrações. Como está sendo efetivado esse tipo de trabalho de mentalização junto ao nossos árbitros que irão atuar na Copa?
Não concordo que a arbitragem aplicada difere. Para mim o comportamento do jogador difere. Veja o clube brasileiro que disputou e compare a conduta dos jogadores no Mundial e no Campeonato Brasileiro. O trio equatoriano que esteve representando a CONMEBOL não mudou sua conduta e sim teve jogos mais fáceis para apitar. No futebol brasileiro e sul-americano o árbitro é mais exigido.

Ainda em relação ao estilo diferenciado de assinalar infrações, não seria o caso de nossos apitos realizarem um estágio de curto prazo e dirigir competições da Uefa por exemplo?
Concordo em reduzir o número de faltas, mas isto não depende somente dos árbitros é uma cruzada de todos que estão no futebol. Fizemos um curso de uma semana com os dirigentes de arbitragem da Inglaterra, veja que isso não teve redução no número de faltas. O futebol precisa da consciência que é um espetáculo e todos tem que praticar o espetáculo e não somente ganhar por ganhar, um vale tudo. Esqueça as faltas e veja quantas vezes o jogador brasileiro chuta a bola para fora do campo e compare com o futebol europeu, a bola quase não sai.

Os árbitros brasileiros já receberam ou receberão orientações e treinamento a respeito da tecnologia (bola com chip) utilizada recentemente na competição do Japão, como vem acontecendo com os apitos da Uefa e de outras confederações?
Ainda não. A FIFA testou somente no Mundial de Clubes e a próxima competição será na Copa das Confederações. Conforme vai participando dos torneios os árbitros vão tomando conhecimentos desta ótima tecnologia.

Aliás, qual é a sua opinião como Instrutor de Arbitragem  no que concerne a implementação da eletrônica para auxiliar a arbitragem a dirimir lances que fujam do seu campo visual no campo de jogo?
Totalmente favorável. O ser humano já chegou ao limite para ver lances que acontecem no jogo. Este esporte não pode mais contar com a sorte que não ocorra lances impossíveis de ver. Sou católico, mas entendo que o árbitro não precisa rezar tanto no vestiário para não acontecer lances no seu jogo. O que vimos na Copa da África é impossível ver a olho humano. Há muita emoção e muito investimento para depender somente de um ser humano, ou trio, ou quarteto e até sexteto, para ver. O atual Presidente da Comissão de Arbitragem da FIFA, Máximo Bussaca teve um lance no seu primeiro jogo na Copa e teve problemas. Um dos melhores árbitros do Mundo, Jorge Larrionda teve seu retorno antecipado por um lance impossível de se visualizar  na África do Sul.  Às vezes que conversei com árbitros que acertaram estes lances perguntava a eles? “E aí, tem certeza?” E eles respondiam: “Não sei vamos ver o que a televisão mostra...”.

Qual é o legado que a Copa do Mundo que será realizada no Brasil, deixará à arbitragem brasileira?
Muita coisa. Além de estádios com melhores condições de exercer o trabalho. Acho que a Copa pode tirar do árbitro brasileiro o peso de ser responsável por tudo:  gandulas, horário de entrada de equipes no campo, uniformes, placar, hinos, fotógrafos, repórteres, tribunal, mascote dos times, torcida que joga objetos, etc e etc... são muitas coisas. No jogo FIFA o árbitro se preocupa apenas em apitar, somente isto, é já é muita coisa. Acho que a Copa vai trazer isto para a arbitragem brasileira. Atualmente o árbitro brasileiro está com muita responsabilidade além das 17 regras.

Quem são na sua opinião na atualidade o melhor árbitro do futebol  brasileiro, o melhor Sul-Americano e o melhor do mundo?
Não gosto de melhor árbitro. Gosto de melhor arbitragem. Um campeonato é feito por rodadas com 10 jogos, são necessários vários árbitros. Na Copa Coreia/Japão estava o melhor do Mundo, Collina, e a arbitragem foi uma lástima. Na Copa da Alemanha não tinha nenhum super árbitro e arbitragem foi excelente. Para mim, esse é o modelo. Prefiro 15 árbitros nota 7 e 8 ao invés de 2 nota 10 e 15 nota 4.

Como Instrutor de Árbitros e em função da sua vasta experiência, qual é o tempo suficiente para se descobrir se um indivíduo tem ou não vocação para ser árbitro promissor?
Vocação para ser árbitro em apenas 15 minutos com o apito na mão. Agora para ter uma carreira, que é importante, são necessários anos e campeonatos. O importante é uma sequência de jogos e fazer o árbitro atingir a maturidade. Eu passei por isso, quando descobri que já tinha maturidade no apito, regra 5, meus jogos se desenvolveram muito melhor.

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