quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Adeus, doutor

Para os amantes do futebol e da democracia, o país amanheceu de luto no domingo, 4 de dezembro, dia da decisão do Brasileirão 2011, um dos mais disputados campeonatos da história do país do futebol. A maioria, na certa acordou mais tarde, recebeu a triste notícia junto com os primeiros raios de sol. Mas foi na madrugada cinza, às 4h30, que o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, comunicou a morte do doutor Sócrates, 57 anos, de infecção generalizada.

Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, ex-jogador de futebol, médico, ativista político, um dos fundadores da democracia corintiana e boêmio de carteirinha, morreu exatamente no dia que seu time do coração entraria em campo para lutar por mais um título. O destino quis assim, ou como na canção do Rei Roberto Carlos, são coisas da vida, choque de opiniões. No caso do Sócrates, nascido em Belém do Pará, a coisa era diferente, o buraco era mais embaixo e precisava saber usar o calcanhar. “A minha agenda sempre termina daqui a 10 minutos, eu vivo o hoje,” disse quando completou 50 anos. Mais ou menos a mesma coisa que cuspiram os punks londrinos no final da década de 70 do século passado: "Não há futuro".

É certo que Sócrates nunca foi punk e nem pessimista. O fato inapelável, contudo, é que o doutor não viu a decisão. Ele foi sepultado no final da tarde do domingão, no cemitério Bom Pastor, em Ribeirão Preto, cidade onde viveu a maior parte de sua vida e onde também entornou muitos chopes no Pinguim, tradicional bar da cidade. Na despedida final, o hino do Corinthians foi entoado por fãs e torcedores que horas depois veriam o Timão da Fazendinha sagrar-se pentacampeão do Brasileirão.

Em 1982, na Copa do Mundo da Espanha, o então capitão Sócrates e seus fabulosos companheiros da seleção, entre eles Zico, Falcão, Cerezzo e Júnior praticaram o que foi chamado pela imprensa européia de "futebol de cinema" e por nós de "futebol arte".  Não conquistaram o caneco, mas a emoção estética produzida por aquele time reverbera até hoje em muitos corações. Da mesma forma, não sairá da mente dos brasileiros a imagem do doutor comemorando seus gols com o gesto de punho cerrado, igual aos Panteras Negras norte-americanos na luta contra o racismo. Lembrarão, também, da sua intensa participação no movimento contra a ditadura e nas mobilizações pela Anistia e Diretas Já!

Paulo Pinto da Silva, torcedor do São Paulo e querido amigo de infância diz pra não esquecer que, antes de iniciar sua carreira no Botafogo de Ribeirão Preto, o doutor jogou pelo Clube Atlético Novo Horizonte, equipe pioneira do futebol da cidade onde nascemos. O Atlético antecedeu o Pima Futebol Clube e o Grêmio Esportivo Novorizontino, que revelou jogadores como Márcio Santos, do Inter e da seleção, o Goiano do Grêmio, e conquistou o vice paulista de 1990.

Títulos, lances mágicos, compromissos com as lutas sociais, esperanças e saudades, eis o quase tudo e o tudo lindo que nos deixa o doutor Sócrates, o amado Magrão.

Moah Sousa
Jornalista, assessor de imprensa do SAFERGS
e produtor cultural

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